quinta-feira, 18 de novembro de 2010

ENSAIO 05/2010

MINHAS ADORÁVEIS QUIMERONALTAS


Quando eu era mais jovem li o livro O MUNDO DE SOFIA  de  Jostein Gaarder, que conta a história de uma menina de 14 anos que recebe lições de filosofia de um personagem misterioso que vai aos poucos contando romanceadamente a história da Filosofia. Não me esqueço da analogia do professor sobre o brinquedo LEGO com suas peças de montar em comparação com o mundo atomístico de Demócrito e o final surpreendente da história em metalinguagem. Recomendo aos moços e aos iniciantes no "mundo de Sofia". Esta menina aprendiz me faz recordar de muitas outras da literatura universal, é a imagem arquétipa de uma jovem aprediz exploradora de mundos estranhos em símbolo da FILOSOFIA. Seria mesmo muito esquisito se o protagonista fosse um menino; (geralmente quando o personagem protagonista é um menino, ele vem do além para nossa mundo), estas meninas estão revelando uma estrutura subjacente, uma esteriotipia (no sentido de impressão inconsciente) que mesmo na Bíblia permanece quando no livro de Provérbios a Sabedoria é personificada por uma pessoa do sexo feminino. Este ensaio, como o nome diz é um ensaio, uma percepção materializada em discurso provisório, um intuição amorfa que passa quilomêtros acima de um esquematismo lógico-argumentativo, ou de um explicitação discursiva irrefutável, mas acho que estas menininhas da literatura que vão da Terra para um mundo fantástico, um mundo do além, um reino de mistério e encanto, representam a FILOSOFIA, o amor pela Sabedoria, que se encarna na figura frágil, doce e em formação de uma jovem. Sendo a Filosofia uma atividade sempre em aperfeiçoamento, em estado de geração, de rascunho que vai na direção da madurez, nada melhor mesmo para representá-la do que uma noviça.  E é o filósofo autoproclamado que faz a comparação de uma moçoila com a Filosofia:
"Quando decidi devotar minha vida ao serviço desta DAMA, formosa entre todas, que os antigos denominaram Afeição à Sabedoria, e que não é no fundo senão a figura jovem e incompleta daquela que no seu esplendor maduro será a Sabedoria mesma; nesse instante, digo, tomei consciência de que deveria, por muitos e longos anos, refrear e sacrificar meu fortíssimo impetus scribendi em favor de impetus cognoscendi..."(Da contemplação amorosa)

Vejamos então algumas de  nossas quimeronaltas:

A primeira de nossas quimeronaltas convocada é a pequena  Alice,  que seguindo um coelho branco penetra em um "País das Maravilhas" passando por peripécias fantásticas, num mundo aparentemente ilógico, com personagens e situações paradoxais, colocando a pequenina às vezes em um estado desesperador como na ocasião em que a biruta da  Rainha de Copas ameaçou cortar-lhe a cabeça. O contraditório, o confronto de opostos, a transgressão das leis físicas, da proporcionalidade,  da continuidade, das magnitudes são nesse mundo uma constante de um mundo sem constantes. Do enquadramento certinho de nosso mundo Alice Linddell é jogada em um mundo totalmente anômico. Ela é a exploradora enviada do mundo imanente para o transcendente.

A segunda de nossas quimeronaltas, é mais modesta e não precisaríamos nem mencioná-la pois realiza apenas uma pequena incursão por uma floresta em direção a casa de sua avó, numa viagem iniciática pelos perigos lupínicos no matagal e demonstra toda sua curiosidade filosófica ao inquirir sistematicamente sua pseudo-avó sobre as alterações em sua aparência que a estavam fazendo ver, ouvir e cheirar mais. Por que na história tinha que ser uma menina? Para sublinhar a fragilidade?

A terceira de nossa quimeronaltas é Dorothy do Texas, que é abduzida, juntamente com seu cãozinho Totó ao mundo do MÁGICO DE ÓZ,  um país fantástico com festa estranha com gente esquisita.

Do Texas para o Brasil o arquétipo se impõe também nos personagens de Monteiro Lobato: Narizinho com suas reinações e Boneca Emilia, muito curiosas e dadas a descobrir coisas.

Ainda no Brasil saindo do papel e indo para a telinha tivemos a minissérie que apresentou nossa quinta quimeronalta e (ex-emília) Maria, no Hoje é dia de Maria, esquisito para caramba, mais até do que todos os outros enredos e personagens mencionados supra. Por que não hoje é dia de João ou José? Por causa da pressão inconsciente do arquetipismo presionando o cêrebro do autor condicionando o personagem desbravador na figura de um pessoa feminina e jovem.


 Embora nossa sexta quimeronalta não vá sozinha, mas vá com seus irmãos masculinos, Lucia Pevensie é a protagonista principal nos livros(eu acho) e filme As Crônicas de Nárnia e a primeira a entrar no portal/guarda-roupa, e a tentar convencer seus irmãos do mundo mitológico escondido que de cristão não tinha nada. Não li nem vou perder meu tempo lendo os livros.


Em repetição insistente como tema cansativamente recorrente nossa sétima quimeronalta é uma menina denominada Ofélia que encontra um ser quimérico em um labirinto... e o resto você pode imaginar (O LABIRINTO DO FAUNO)

É interresante que as vezes no desenrolar das narrativas descobrimos a origem nobre das mocinhas e que ocacionalmentre sua origem é do além também. Uma princesa desaparecida...



Parece-me que nossos esforços em busca de conhecer o que é desconhecido assume a configuração simbólica de uma jovem mulher, que vai do aquém para o além, existem exceções como seria de se esperar como a Mulher Maravilha que vem de seu reino amazônico ou com todo o respeito, de Nossa Senhora, que manda as mensagens do reino transcendente para  nós mortais. Mas são exceções.



Geralmente quem vem do desconhecido é um menino como Peter Pan, O Pequeno Príncipe, Kal-El e novamente, com todo o respeito, Jesus Cristo ("por que um menino nos nasceu, um filho se nos deu" -Escrituras)




Parece até que a Revelação, os Avatares, as formas de comunicação do além para cá, geralmente devam ser simbolizadas pelo masculino e daqui para o além pelo feminino.



Na Bíblia a Sabedoria declara:

"Eu amo os que me amam, e os que de madrugada me buscam me acharão."
ABSOLUTUM

Post Script: Hoje 5 de julho de 2011, me lembrei de mais uma recorrência de uma menininha explorando o além, e como imagens falam mais que mil palavras...


E mais essa (em 13/09/2011) de minha mais tenríssima infância, a PIMPA  do livro SOZINHA NO MUNDO (um dos primeiros livros que lí integralmente)

***

 
(Em 28 de setembro de 2011)

Há sim lembrei-me de uma exceção a esta tese, é de uma garotinha assustadora que vêm do mundo do além, inclusive sai de dentro da televisão, um complemento dialético de Carol Anne  a menininha do Poltergaister. É a Samara Morgam.
É um dado que não se encaixa na minha teoria, se bem, que ele, o tema de Horror da Samara, é de Origem oriental. Diferente do pensamento e arquétipos do Hemisfério Oeste. Lá luto é branco, aqui é preto...
De qualquer forma, fica registrado o dado incoerente com a tese das quimeronaltas, numericamente pequeno é certo...


sexta-feira, 5 de novembro de 2010

ENSAIO 04/2010

LIMBO


Se existe alguém que é infinitamente livre este alguém é Deus. Deus não se contrai à nenhuma gênero, nenhuma espécie, é o indizível, o indefinido, o incatalogável e o ininquadrável. Nada o pode restringir, constranger ou limitar. Sendo assim ele e só ele existe na plena acepção da palavra. Ele é o SER. "Eu sou o que sou". O Absoluto quer dizer solto de tudo. As demais coisas só existem na medida em que tem participação com a realidade absoluta. Cortando-se a comunhão com Deus os outros seres entram imediatamente num processo de nadificação.  A tudo o que foi criado, dos seres sencientes aos seres inanimados podemos aplicar o conceito de LIMITADOS. Todos os entes que foram criados são contingentes. Devem sua existência à causa primeira, que não foi causada,  o motor que não é movido. Anjos, humanos e animais foram criados por Deus e por isto são escravos de parâmetros, de rotinas, subrotinas e ciclos matemáticos, lógicos, naturais etc. Quando Deus criou o mundo fê-lo dentro de padrões lógico-geométricos e de "leis" físico-químicas que impõe uma escravidão, um cerceamento sobre suas criaturas. Não posso respirar dentro d´água a não ser que crie um mini-sistema atmosférico, uma sub-rotina com um cilindro de gás respirável. Um mecanismo que reproduza as condições do ambiente que respiro naturalmente, desta vez colocando um simulacro de atmosfera  dentro de uma ambiência aquática num reduzido modelo  aeróbico.  Não posso voar a menos que "burle" as leis da gravidade por meio de equipamentos e dispositivos que levantem meu corpo do solo a que estou condenado a viver.  Todos os seres vivos vivem subordinados a rotinas e ciclos. Não podem quebrar estas rotinas e ciclos podem inventar (no caso dos inteligentes) dispositivos baseados nestas mesmas rotinas e ciclos que os permitam driblar as leis férreas a que estão submetidos. Vivemos dentro de um enquadramento, um conjunto cibérnetico que geralmente tem subconjuntos. Os entes autoconscientes também são limitados por leis que controlam a subjectividade, constrição esta muitas vezes advinda do suporte biológico destes seres. Ódio, medo, angústia, estresse e depressão existem na subjetividade por causa da herança animal. São programas ou vírus (apêndices atávicos) que assolam a inteligência e a vontade dos sujeitos. 
Quem quer que viva muitos anos a observar determinada faceta ou aspectos dos objetos, ou algum fenômeno por muito tempo chegará a apreender padrões recorrentes na natureza. Na verdade é da catalogação destes conhecimentos de padrões em sistemas que nascem as ciências. Existem coisas que sou obrigado a fazer. Tenho que beber água se não morrerei por desidratação. Meu corpo é um sistema que não pode viver sem água e o ciclo hídrico do meu corpo se repete décadas a fio para que eu possa continuar existindo como unidade biológica. Minha parte anímica, minha alma ou psiquismo obedece a parâmetros desta vez de ordem  psicológicas e lógica. 
O leitor se lembra de um programa de proteção de tela de computador que era um labirinto tridimencional? O programa mostrava a imagem de vários corredores interligados em compartimentos sem saída para o exterior subdividido por paredes de tijolos. O programa rodava e rodava de novo dentro de ciclos e rotinas. Se você observa-se por muito tempo, pelo acumulo de repetições, começaria a entender padrões e a  lógica interna do "jogo".  Aquilo é uma prisão atordoante, desesperadora se alguém tivesse que passar muito tempo dentro daquilo em 3D.
Estou persuadido de que todas as coisas criadas estão presas dentro de ciclos e rotinas de várias naturezas, e sendo assim todas as coisas relativas, incluindo quem escreve e quem está lendo este texto são escravos. A boa notícia é que podemos escapar desta prisão imanente mas somente através da obediência a esta imanência, compreensão, absorção  da mesma, só assim atingiremos a transimanência ou a  transcendência. Como disse o Cristo: "conhecereis a verdade, e a verdade vós libertará" , creio que isto se dá não apenas em sentido espiritual e moral, mas em todos os outros sentidos.
 O oposto , a desobediência e o desconhecimento dos ciclos e rotinas, do Karma, levará à mais restrições, a um estreitamento ontológico no nosso ser, no nosso tempo de vida e do  nosso espaço. Veja o exemplo dos criminosos que em violação as leis jurídicos-sociais  são jogados num limbo espacial restrito, os presídios e cadeias.
A violação das leis sociais acarreta punição em forma de restrição espacial. Se dentro da cadeia o infrator violar as regras internas do micro-sistema prisional ele será mais restringido ainda e irá para um cubículo chamado solitária. Uma prisão ao quadrado, uma restrição dentro de outra restrição. Você consegue imaginar outro estágio de restrição?
O mundo é limitado e contingente e por isso é uma espécie de "limbozão" para as criaturas que vivem dentro dele submetidos aos seus ciclos e rotinas. Na verdades, as criaturas como partes constitutivas do mundo apresentam em si mesmas na sua ontogenia e ontologia restrições e limites, ciclos e rotinas que se não forem obedecidas e conhecidas acarretaram redução ontológica.  Foi este o caso dos anjos que se transmutaram em demônios. Condenados ao abismo. A salvação cristã, o Nirvana, o paraíso mulçumano, o valhala, o céu e etc. São o escape transcendente da imanência do mundo, uma expansão ontológica. Já o inferno é uma redução do ente, uma constrição redutivista, um prisão no limbo de ciclos e rotinas cada vez mais apertados. Vivemos presos a estes limbos em sentido mental-cognitivo, como também ao afetivo sendo que a única parte de nosso ser que não está presa a nenhum limbo cíclico é  nossa VONTADE, a imagem  de Deus no homem. A parte verdadeiramente livre. O livre-arbítrio colocado no homem por Deus.
A   VONTADE é LIVRE, a cognição e os sentimentos não. Estes últimos obedecem a regras, estruturas intrínsecas, ciclos e rotinas. Você pode usar sua vontade livre para danar sua alma, numa redução ontológica, ou obedecer a Deus e crescer ontologicamente tendo cada vez mais liberdade.  Se aproximando do Divino, do Absoluto, compartilhando cada vez mais sua natureza livre, galgando degraus numa ascensão existencial.
PRISÃO LÍMBICA
Uma fila de um banco, de um hospital do SUS, é como uma prisão, uma fila é uma estrutura espacial restritiva coordenado indivíduos numa trajétoria  cronotópica para atender as necessidades dos  cidadãos. Você é obrigado a ficar estacionado, as vezes em pé por algum tempo. Ninguém gosta disto, uma fila é um limbo. Você fica preso ao deslocamento sequencial das pessoas. Sem poder ter acesso a outros estímulos a não ser uma prosa sobre banalidades.  Excetuando-se os castigos corporais, TODA PUNIÇÃO É RESTRIÇÃO, DIMINUIÇÃO. Da sua riqueza, no caso de multas, da sua capacidade de locomoção, ou direito de ir e vir no caso de penas de prisão. Uma cela é um limbo por redução de espaço e estímulos de possibilidades de ação e paixão.
Vou exemplificar alguns limbos desde muito fechados até mais abertos:
Nós vídeo-games temos exemplos de ações restritas por regras (Esta é minha definição pessoal de jogos - manobras dentro de regras) muito simples, lembre-se do mundo do PAC-MAN, com rotinas apertadas.
Existe um desenho animado  que é um limbo padrão, onde os dois únicos personagens obedecem ciclos e rotinas férreas e recorrentes, O desenho do Papa-léguas.
 Nesta animação da Warner Brothers o  Coiote vive única e exclusivamente para pegar o pássaro e este para fugir. O tema é o mesmo com infinitas variações. Se você nunca percebeu que aquilo é um inferno semelhante ao castigo de Tântalo ou de muitos outros no inferno de Dante vai começar a notar agora. 
Preso a premissas de aço o Coyote passa seu tempo em um presente eterno (o limbo não só é um prisão espacial como temporal)  numa girândola sem fim inventando mil artimanhas e estratégias para pegar o papa-léguas e no final, não conseguindo ainda se ferra de verde e amarelo (ou de estrelas e listras) e depois começa tudo de novo, tendo por único cenário o quênio percorrido pelas estradas asfaltadas de algum lugar indefinido nos EUA.
 É igual a maioria dos seriados de televisão que possuem premissas recorrentes. Como no seriado antigo do Batman que era aprisionado em um armadilha pelo supervilão e sempre escapava para no final cair numa nova armadilha para escapar no episódio seguinte. Como também nos programas humorísticos com seus bordões repetitivos. No caso do Papa-léguas imagino o que aconteceria se uma coiote fêmea aparecesse no sistema como um trojan, dentro da história. Quebraria as rotinas da narrativa.
 O Desenho da Caverna do Dragão também era um limbo com ciclos e rotinas permanentes, inclusive aventou-se a hipótese de os meninos estarem mesmo no inferno.  Embora seja um limbo o mundo da Caverna do Dragão varia em locações, em personagens, em eventos, sendo mais aberto, com mais diversidade. Vários níveis acima de Papa-léguas. Poderia sistematizar os desenhos animados e classificar em níveis ou estágios límbicos, mas deixo para o leitor. Tentei fazer apenas este gráfico:
 A biota cibernética, o sistema ecológico terrestre, é um limbo preso em ciclos e rotinas e nosso corpo está preso a este sistema. Nossa mente (alma) quando erámos bebês saiu de um limbo de insconciência e se ampliou desmesuradamente. As agressões do mundo externo objetivo, gerou em nossa psique mecanismos de defesa freudianos que podem crescer  englobando toda a psique e aprisionar nossa mente em ciclos e rotinas neuróticas e psicóticas. Os mecanismos de defesa podem implodir nossa psique. Podem nos cercar e constranger nos aprisionando num limbo psicológico, nos fazendo regredir  a estágios anteriores no desenvolvimento mental.
O caráter e a personalidade são prisões imanentes para as pessoas, elas estão presas a si mesmas a sua identidade, ao seu estilo, advindos pela repetição de atos ao longo de anos.
Somente conhecendo a  nós mesmos, podemos transcender-nos, somos presos pelos  nossos hábitos, sentimentos e pensamentos, a partir do momento em que saimos de nós mesmos e contemplamos estes ciclos e rotinas, escapamos da prisão imanente, transcendemos o LIMBO criatural da fatalidade intrinseca da vida.
Uma obcessão é análogo no mental a um local límbico, a pessoa fica presa num curto-círcuito cognitivo. (eu tinha uma denominação própria para isto, CIRENGRAMA, ou engrama circular.) Uma pessoa que sofreu uma grande injustiça e ficasse obcecada com a vingança, congela no tempo, vive aquele momento de vitimização como se fosse um momento eterno congelado, um episódio atomistíco irrelacionado como os autistas, que  vivem num limbo relacional. O eu solipsista cartesiano pode ser uma prisão límbica, num presente perpétuo. A palavra limbo vem do latim limbus, que quer dizer fronteira, borda. Se colocarmos o SER no centro de tudo, aqueles seres que estiverem mais distantes do ser e  próximos ao não-ser, estarão nesta borda límbica. A própria autoconsciência é já uma transcendência do sujeito, o conhecer o próprio ato de conhecer é já uma ampliação de essência. É quebrar a rotina...




ABSOLUTUM